COMISSÃO DA VERDADE: INSTALAÇÃO NO DIA 16 DE MAIO. A ANPUH ESTEVE LÁ.

Quinta-feira nublada no céu, desanuviada na terra. Salão Nobre do Palácio do Planalto repleto.

Um imenso leque de interesse republicano pela instalação da Comissão da Verdade, tão esperada, e há tanto tempo. A Anpuh está presente.

Autoridades de todos os tipos: Ministros, Governadores, Senadores, Deputados, Prefeitos. Brasileiros e brasileiras em quantidade, portadores da memória recente da História do Brasil, direta ou indiretamente ligados à história desde 1946, e especialmente desde 1964. Um ambiente simultaneamente grave e jubiloso, sóbrio e emocionado.

Pouco depois das 11h30 descem a rampa de cerimônia a Presidente da República e seus convidados, institucionais e simbólicos: os ex-presidentes José Sarney, Fernando Collor, Fernando Henrique Cardoso e Luís Inácio Lula da Silva (um ausente, que será mais adiante lembrado no discurso da Presidente: Itamar Franco), os presidentes da Câmara dos Deputados, do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça.

Os aplausos são ensurdecedores.

A cerimônia se abre com a mensagem da Alta Comissária das Nações Unidas para os Direitos Humanos, a sul-africana Navanethem Pillay, lida pelo representante regional, Amerigo Incalcaterra. Os termos são comedidos e límpidos: felicitações ao Brasil, que enfim alcança essa etapa, da qual se espera grandes resultados para a sociedade de ontem, com o desvelar das informações e a recuperação da memória, como para a de hoje e a de amanhã, com a garantia de que os direitos não mais venham a ser negligenciados ou desrespeitados.

Segue-se a assinatura dos termos de posse, pela Presidente e pelos integrantes da comissão, um a um. Claudio Fonteles, Gilson Dipp, José Carlos Dias, José Paulo Cavalcanti Filho, Maria Rita Kehl, Paulo Sérgio Pinheiro, Rosa Maria Cardoso da Cunha.

O ex-ministro da Justiça e membro da Comissão Justiça e Paz da Arquidiocese de São Paulo, José Carlos Dias, fala em nome da comissão. Um discurso de memória, relembrando os longos caminhos percorridos até esse dia, de um discurso-programa, marcado pela consciência da responsabilidade social e política da missão.

A Presidente da República assina o decreto (7.724/2012) que regulamenta a lei de acesso à informação (12.727/2011), com o qual se levanta enfim o véu que por tanto tempo restringiu o conhecimento e a pesquisa nos documentos públicos.

Segue-se um breve, forte e intenso discurso da Presidente. Nele há passagens típicas das transições negociadas: "Assim como respeito e reverencio os que lutaram pela democracia enfrentando bravamente a truculência ilegal do Estado, e nunca deixarei de enaltecer esses lutadores e lutadoras, também reconheço e valorizo pactos políticos que nos levaram à redemocratização" como uma conclusão em que se encontra uma ênfase clara e altaneira:

"Acreditemos que o Brasil não pode se furtar a conhecer a totalidade de sua história. Trabalhemos juntos para que o Brasil conheça e se aproprie dessa totalidade, da totalidade da sua história.

A ignorância sobre a história não pacifica, pelo contrário, mantêm latentes mágoas e rancores. A desinformação não ajuda apaziguar, apenas facilita o trânsito da intolerância. A sombra e a mentira não são capazes de promover a concórdia. O Brasil merece a verdade. As novas gerações merecem a verdade, e, sobretudo, merecem a verdade factual aqueles que perderam amigos e parentes e que continuam sofrendo como se eles morressem de novo e sempre a cada dia.

É como se disséssemos que, se existem filhos sem pais, se existem pais sem túmulo, se existem túmulos sem corpos, nunca, nunca mesmo, pode existir uma história sem voz. E quem dá voz à história são os homens e as mulheres livres que não têm medo de escrevê-la. Atribui-se a Galileu Galilei uma frase que diz respeito a este momento que vivemos: "a verdade é filha do tempo, não da autoridade."

O início da tarde do dia 16 de maio viu raiar no horizonte do Brasil um novo bater das asas da liberdade. Fomos todos para casa ou para o trabalho com ânimo renovado. Agora vem o necessário trabalho do quotidiano - que, se for longo e penoso, será também paciente, persistente.