NOTA DE FALECIMENTO - PROFESSORA JUNIA SALES PEREIRA

A Associação Nacional de História - ANPUH-BRASIL informa com enorme pesar o falecimento da nossa companheira Junia Sales Pereira, professora doutora da área de Ensino de História na Universidade Federal de Minas Gerais, no dia 28 de julho de 2019.
Nossa comunidade está enlutada pela partida dessa referência intelectual, profissional e afetiva para a nossa área de conhecimento.
Externamos nossas condolências e carinho aos seus familiares, amigos e colegas de trabalho da UFMG.

Como homenagem à querida professora Junia Sales Pereira divulgamos suas reflexões sobre a vida e a partida, publicadas nas redes sociais no início deste ano:

O viver é em camadas. Camadas profundas, camadas de meia vida e camadas ligeiras. Quando nascemos, encontramo-nos dentre aqueles que estão em profundidade. Comunicamo-nos com o que há de mistério e iniciação. Estamos no alvor dos dias, não sabemos ainda o que é e o que não é. Tudo em nós é, como Platão um dia preconizou. Ser e realização identificam-se, emaranham-se. Ao meio da vida encontramo-nos ao meio, como deve ser. O meio da vida, o meio do existir. É o momento de junção entre ser e não ser, a realização de tudo o mais que poderíamos ser e a concretude do que sonhamos. Estamos com o sol a meio pino, brilhamos então mais que a luz. É quando podemos sentir o fluxo com a força das chamas mais fortes, fazendo de nós o que uma fogueira faz da madeira, ao exalar calor e potência. Encontramo-nos com o não ser, e descobrimos o que a face da vida sem sentido pode fazer encobrir de nós, sendo o que restaria de concretude e de abstração. Tal como um dia escrevinhou Guimarães Rosa, somos como o pai ao entrar num rio cujas margens jamais se encontrarão, um pai que se postou à terceira margem, e fez fluir de sua vida o que era força, coragem e enfrentamento. Ao viver o terceiro tempo da vida, o encontro com o fim da vida, seja provisório ou permanente, retornamos à profundidade que em nós habitava quando ao mundo chegamos. Trazemos à tona a consciência plena da totalidade, convocando todas as camadas à compreensão. É quando o silêncio, a entrega e a consciência fazem de nós um plano concreto, um ser em inteira forma, sobrepondo todas as camadas à flor renascente que nos tornamos ao passarmos pela terra mais uma vez. Tal como um dia nos disse Clarice Lispector, é quando nos tornamos estrangeiros de nós mesmos. Tudo o que foi, poderia ter um dia sido um pouco diferente. E tudo o que nos resta é o pleno agradecimento. As camadas ligeiras, perguntam-me vocês, estas, sim.. estas perpassam a vida em todos os momentos. Enredam-se como camadas de cebola ao que é e ao que não é... São os instantes, os pequenos momentos em que a alma para para ouvir o som de bicadas de galinha na couve, um ronronar de gato ou para ver um foco de luz de vaga-lume, ou, ainda, para observar o canto direito da boca de uma pessoa amiga, com um sorriso pequenino, trazendo o segredo de uma ironia, ou uma brincadeira, uma demonstração de que a vida passou ali, deixando frescor, apesar de tudo. Nestes pequenos instantes, somos como Salvador Dali, pessoas em pequeno delírio.