NOTA DA ANPUH AO EXCELENTÍSSIMO SENHOR DR. DD. MINISTRO DA JUSTIÇA

EXMO. SENHOR,  

A ANPUH, o meio acadêmico, científico e cultural brasileiro acompanham, com extrema preocupação, as mudanças administrativas e de acesso às informações em curso no Arquivo Nacional. Há décadas o ARQUIVO NACIONAL tem experimentado um processo de crescimento e profissionalização que tornou possível sua equiparação aos mais modernos arquivos nacionais de todo o mundo. Ainda que possa ter sofrido pequenas inflexões nesse processo, nunca chegou a conhecer retrocesso quanto ao acesso público aos seus acervos e fundos, tendo sempre se pautado por possibilitar a consulta de todos, historiadores e pesquisadores em geral, em respeito aos direitos do cidadão e suas demandas legítimas. E, a se considerar as notícias veiculadas pela imprensa, desenha-se um quadro inaceitável que coloca em risco a função da entidade e seu diálogo com seus congêneres no mundo.

É importante salientar que o AN é um órgão de ESTADO e não de governo e, portanto, deve servir ao ESTADO e ao CIDADÃO brasileiro. A renovação dos quadros dirigentes em órgãos da esfera pública do poder Executivo constitui-se em prática necessária e salutar. Entretanto, as mais recentes ações da Direção do Arquivo Nacional têm demonstrado diretrizes que fogem ao respeito pela estrutura administrativa do órgão e suas competências. Entretanto, o uso da direção da instituição como moeda de acordos políticos, a substituição de alguns de seus postos-chave por pessoas sem igual grau de experiência e as restrições ao acesso dos originais que custodia são atitudes que desrespeitam as competências, a missão e a história do órgão.

É significativamente óbvio que o Arquivo Nacional é uma instituição com características bastante peculiares e sua gestão requer formação acadêmica e técnica de alto nível, tendo em vista a extrema complexidade e os desafios que se colocam para instituições do gênero em âmbito internacional. Assim, o ocupante do cargo deve conhecer área de arquivos, estar familiarizado com as modernas necessidades de uma instituição desse porte, ter competência para dialogar com órgãos internacionais especializados e conhecer as tendências da pesquisa científica, além de zelar pelo uso público do arquivo, o que a necessidade de agendamento para a pesquisa e a suspensão do acesso aos originais do Arquivo Nacional (quando a maior parte do acervo não está digitalizado) e mesmo a necessidade de agendamento para pesquisa são práticas reprováveis face as regras estabelecidas pelo próprio Estado brasileiro que, legalmente garante o direito de acesso à informação

Nas últimas décadas, o Arquivo Nacional, principal instituição arquivística, brasileira, desenvolveu uma série de parcerias com entidades nacionais e internacionais e se constituiu em principal referência para a salvaguarda da documentação histórica do país. Os diversos projetos de cooperação, tais como o Programa Memória do Mundo e o Centro de Referência das Lutas Políticas Memórias Reveladas, são apenas algumas, de suas bem sucedidas iniciativas, reconhecidas no meio acadêmico e na sociedade civil. Ademais, o Arquivo Nacional atua como órgão central de um dos nove sistemas estruturantes da Administração Pública Federal, o Sistema de Gestão de Documentos de Arquivo (SIGA), além de ter a incumbência de acompanhar e implementar a Política Nacional de Arquivos, conforme definida pelo Conselho Nacional de Arquivos (CONARQ).

Para que essa trajetória se consolide e avance, é fundamental que a escolha do gestor de tão importante instituição, responsável pelas políticas arquivísticas do Brasil, no que concerne à gestão, preservação e ao acesso aos documentos, paute-se unicamente pela competência e experiência, de modo a assegurar a manutenção e a ampliação das políticas de interesse público e a reafirmação de seus compromissos com a sociedade brasileira.

Diferentes matérias na imprensa e a própria ação do MPF nos levam a questionar atitudes da atual direção que contrariam o conceito de Estado Laico e que podem ameaçar o bom funcionamento do Arquivo Nacional como órgão do Estado, fundamentado nos princípios de laicidade e equanimidade que se exige de um órgão público.

A Associação Nacional de História (ANPUH), que tem entre seus objetivos a proteção, aperfeiçoamento, fomento, estímulo e desenvolvimento do ensino e da pesquisa da História, em seus diversos níveis, e das demais atividades relacionadas ao ofício do historiador, reitera a importância da escolha de quadros altamente especializados na gestão de instituições públicas, como é o caso do Arquivo Nacional, de forma a atender todos esses requisitos.

Diretoria da Associação Nacional de História (ANPUH-Brasil)