GT ESTUDOS DE GÊNERO - NOTA DE REPÚDIO (VIOLAÇÕES PERPETRADAS CONTRA OS DIREITOS DE UMA CRIANÇA)

O GT Nacional Estudos de Gênero da ANPUH-Brasil vem a público manifestar seu repúdio e indignação sobre as seguidas violações perpetradas contra os direitos de uma criança de 10 anos, grávida devido a quatro anos de seguidos estupros cometido por familiar. O caso ocorreu no Espírito Santo e foi noticiado esta semana.

Além da situação de flagrante perversidade, o caso ainda expõe a miséria da política dos setores fundamentalistas da nossa sociedade, quando pessoas eleitas para garantir o respeito às instituições públicas de defesa da justiça e da democracia lideram atos criminosos ao se posicionarem contra o cumprimento da lei, incitar manifestações contrárias aos direitos da menor e ao colocar em risco de morte uma criança vítima de violência.

É importante destacarmos que a violência sexual contra crianças e adolescentes, realizada em sua maior parte por familiares e conhecidos, traz a tona dados que indicam uma pandemia silenciosa no país.

Aspecto corroborado pela alta taxa de mortalidade entre mães jovens (até 19 anos), como apontam estudos do Ministério da Saúde. Sendo uma das consequências dessa violência sexual a gravidez, a vítima do estupro é ainda obrigada a lidar com mais uma violação em sua saúde física e mental.

O caso dessa menina de 10 anos se insere nos dispositivos formulados desde 1940 no Código Penal, que permitem a realização do aborto legal em caso de estupro e risco de vida da gestante, prevendo o respeito à decisão da vítima em levar ou não a gestação adiante, sem necessidade de Boletins de Ocorrência, laudos do IML ou decisões judiciais. Desta forma, a discussão que envolveu dúvidas acerca da interrupção da gestação que, felizmente, foi realizada em segurança, coloca-nos desafios que persistem na sociedade brasileira.

Falamos de uma realidade historicamente enraizada de controle sobre os corpos das mulheres, sua sexualidade e reprodução, que se travestem de argumentos moralizantes, estigmatizando as pessoas que vivenciam experiências de aborto. Esta visão que submete as mulheres a riscos indiscutíveis se estende às crianças, especialmente as meninas, como o caso em questão denota claramente.

Um desafio que se coloca urgentemente, portanto, é promover um debate público esclarecido sobre aborto, direitos humanos das mulheres e, sobretudo, a inclusão de temas como gênero e sexualidade na educação básica, de maneira a prevenir a existência dessas violações.

Brasil, 16 de agosto de 2020.