Manifesto do GTHA sobre a BNCC Destaque

 
 
Em 2016 realizaremos a reunião do GTHA na UFF com a temática "Novas Fronteiras de Pesquisa em Antiguidade no Brasil", entretanto a proposta de currículo de História da Base Nacional Comum Curricular (BNCC) encontra-se na contramão das políticas de ensino governamentais tanto quanto das atuais abordagens de pesquisa e ensino de História e de História Antiga no Brasil e no mundo... 
 
 
 
 
29 Nov 2015 0 comment
(0 votos)
 
Um Manifesto pela História e pelas Experiências das Culturas da Antiguidade
 
Adriene Baron Tacla
Alexandre Carneiro Cerqueira Lima
(UFF/ NEREIDA/ GTHA/ ANPUH)
 
Em 2016 realizaremos a reunião do GTHA na UFF com a temática "Novas Fronteiras de Pesquisa em Antiguidade no Brasil", entretanto a proposta de currículo de História da Base Nacional Comum Curricular (BNCC) encontra-se na contramão das políticas de ensino governamentais tanto quanto das atuais abordagens de pesquisa e ensino de História e de História Antiga no Brasil e no mundo. Hoje, o governo federal possui programas de incentivo à internacionalização do ensino (a exemplo dos programas Ciência sem fronteiras do CNPq e Escola de Altos Estudos da CAPES, para só citarmos dois dos mais famosos) e na academia falamos de História Global e Transnacional, que renovou a reflexão acerca das fronteiras nacionais (como colocam Curthoys e Lake em "Connected Worlds History in Transnational Perspective" de 2005). Nesse cenário, a BNCC vem propor uma história nacionalista e que não pensa a integração do Brasil ao restante do globo. Como explicar à sociedade brasileira, aos pais e alunos essa incoerência em termos de programas e políticas nacionais de ensino e pesquisa?
 
A proposta da atual Base Nacional Comum Curricular não fomenta ao jovem estudante o exercício de raciocínio histórico, pautado na comparação e na transversalidade. Temáticas como 'escravidão', 'navegação', 'colonização', 'leitura' poderiam ser trabalhadas em sociedades/ culturas separadas no tempo e no espaço. Percebe-se um total desconhecimento, por exemplo, de propostas renovadoras no campo da História Comparada (pensamos aqui nas últimas obras de Marcel Detienne ou mesmo da história global ou das histórias conectadas – haja vista os trabalhos de Sanjay Subrahmayan). O conteúdo curricular da base trabalha somente com uma história nacional e, mesmo assim, de forma acanhada e simplória. As atuais abordagens na área de História do Brasil são ignoradas, e até mesmo se mantém uma visão ultrapassada da organização da economia brasileira nos períodos colonial e imperial, para citarmos apenas um exemplo. Fica, assim, evidente que o investimento das agências de fomento (CAPES, CNPq, FAPERJ e FAPESP, dentre outras) em pesquisas nos Programas de Pós-Graduação em História, sobretudo das pesquisas feitas no âmbito dos programas de níveis 6 e 7 na avaliação da CAPES, não foram levados em consideração. O 'fosso' entre Pesquisa e Ensino não apenas permanece, mas se alargou. Isso é extremamente grave, pois estamos lidando aqui com investimentos públicos para a produção de conhecimento, que deveria ser empregado na formação de nossos jovens.
 
A proposta de História na BNCC não respeita o estudante, aliás, enxerga o (a) jovem como 'incapaz' de poder compreender experiências múltiplas e diversas ao longo da História da Humanidade. Isso demonstra um total desconhecimento da atual juventude brasileira, extremamente 'conectada' com as redes sociais e com o vasto manancial de informação disponível na WWW. A rede mundial de computadores (internet) descortina um mundo de amplos horizontes para os jovens brasileiros que vão além de uma sala de aula, de uma escola, de uma rua, de um bairro, de uma cidade e de um país. Tratar somente de uma História Nacional (e desconectada – com o perdão do trocadilho...), sem levar em conta as experiências de outras sociedades e culturas não irá jamais cultivar o exercício histórico de comparação e de tecer relações/ conexões no tempo e no espaço. Pior, cria-se a ilusão de que o conhecimento histórico em nada se relaciona com o mundo vivenciado pelo alunado. O (a) jovem brasileiro(a) tem o direito de possuir uma formação pautada pelo exercício do reconhecimento das diversas experiências/alteridades. Acima de tudo, os jovens brasileiros têm o direito de compartilhar do conhecimento produzido pela humanidade, nem que seja ao menos dos grandes marcos da história mundial a fim de compreender e criticar o mundo em que se inserem, o mundo em que vivem.
 
Ao contrário do que concebem os idealizadores do currículo de História da BNCC, a História Antiga e também a Medieval não estão tão distantes dele. Como podem os jovens brasileiros entender o que representou a entrada dos tanques americanos sobre os vestígios da antiga Babilônia (no atual Iraque) ou mesmo o saque e a destruição do museu do Iraque, se nada sabem a respeito da sociedade da antiga Mesopotâmia? Vale destacar que alguns dos primeiros selos de escrita da humanidade foram roubados durante esse saque. Como podem entender os embates das guerras étnicas da Europa contemporânea sem nenhum conhecimento do Medievo? Como podem entender os usos da Antiguidade e do Medievo nos discursos políticos contemporâneos, se nada conhecem desse passado?
 
Os estudos da pré e proto-histórias, assim como da Antiguidade e do Medievo, hoje pensam as movimentações populacionais entre os continentes, a circulação de ideias e objetos pelo Atlântico, pelo Mediterrâneo, Oceano Índico e até o Mar da China. Portanto, não perpetuam visões eurocêntricas, mas ao contrário as combatem. Ao invés de questionar cronologias, o currículo da BNCC cria visões distorcidas do passado, como se a história anterior às expansões marítimas modernas em nada tivesse a ver com a história do Brasil, como se a própria história do Brasil não se inserisse em uma história global e conectada, como se ideias, pessoas e objetos não circulassem, ou melhor dizendo, circulassem apenas em épocas e terrenos claramente circunscritos e selecionados – Brasil, América e África a partir de 1500 d.C., e como se questões políticas internacionais (mesmo dessas épocas) não tivessem intercessões com os debates e movimentos que ocorrem no país.
 
O GTHA colheu sugestões a partir de uma discussão entre seus membros e organizou um conjunto de propostas, a saber:
 
1) fazermos um texto coletivo repudiando a BNCC e apontando todos os erros, problemas e distorções que ela pode gerar;
 
2) colocarmos o texto como petição online a ser assinada pelos colegas dos GTs que com ela concordarem, destacando as siglas e cargos de cada um;
 
3) solicitar que especialmente os chefes de departamento e coordenadores de licenciatura de todos os cursos de História assinem, assim como as regionais da ANPUH;
 
4) enviar a petição ao MEC e publicar no site da ANPUH Brasil.
 

 

 

 


Última modificação em %03/%108/%2015

CONTATO RJ

 LOGO ANPUH RETANGULAR RJ
T: (21) 2332-1430 / 99618-0813