GORENDER: O HISTORIADOR EM COMBATE

Faleceu nesta semana o historiador Jacob Gorender. Insatisfeito com as explicações teóricas acerca do Brasil colonial publicou, em 1978, sua obra de maior fôlego, O Escravismo Colonial, cujo objetivo era o de “estudar o escravismo colonial no Brasil ao nível do conhecimento categorial-sistemático da história”! Nós da Revista Arrabaldes o conhecemos por volta de 1988, graças ao empenho e admiração do principal editor da revista, Renato Pitzer. Naquela época, discutíamos a obra de Gorender nas salas de aula, nas mesas de bar ou em algum lugar onde a conversa sobre a escravidão no Brasil se tornasse a pauta de um grupo.

Nascido em Salvador em 1923, o advogado de formação Jacob Gorender foi considerado por muitos como o mais importante historiador marxista brasileiro de todos os tempos. Segundo, Mario Maestri após a publicação daquele livro, Gorender foi trabalhar na editora Abril Cultural, onde coordenou a coleção Os economistas. Sua obra, Combate nas Trevas, de 1987, desnudou muita coisa feia nos bastidores do período da ditadura e o livro tornou-se referência a uma nova geração de historiadores do século XXI. Recebeu o título de Doutor Honoris Causa, pela Universidade Federal da Bahia em 27 de outubro de 1994. Dois anos depois, foi reconhecido pelo Departamento de História da USP, recebendo o título de Notório Saber.

Polêmico, ácido, metido, eram muitos os adjetivos depreciativos que se divulgavam sobre ele. Não era à toa. Gorender não era nada fácil. Para quem foi militante e torturado na ditatura, os adjetivos que lhe eram dados não tinham a menor importância. Acreditava na história como motor da transformação do mundo. Em entrevista concedida à Revista Arrabaldes em 1988, asseverou: “vejo a história como ciência da revolução e também componente fundamental na construção do universo ideológico”.  Ele era um bom velhinho, engajado e implicante! Quem de nós conseguiria escrever um livro após dois anos de prisão e submetido à tortura? O bom velhinho era também genial.

 

por Márcia Motta (professora de História Moderna e Contemporânea na Universidade Federal Fluminense)